sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Mãe África


Ele chora

O corpo fraco, frágil, se estende nos ossos do colo da mãe

E ele chora silenciosamente...

Não desperdiça o pouco da força que lhe resta com soluços e escândalos

Com um esforço sobre-humano, ergue o braço e puxa um pedaço de pele colado à barriga daquela mulher

Puxa a pelanca e leva ate sua boca. Suga, suga, suga... Mas não há nada ali

Não há leite, não há água.

Mas não estão totalmente vazios os seios daquela sofredora

O menino talvez encontre no meio daquele misto de pele e curubas, de lama e de pus

Alguma gota de suor ou lágrimas escorridas que possam saciar sua sede

Talvez encontre até algo maior...

Encontre esperança e imagine pelo menos por dois minutos que vai ter um futuro

Pode ser que ache também força.

Pode ser que essa força permita-o não expor ainda mais seus ossos

Pode ser que esta força o faça conseguir virar o pescoço e olhar para a mãe que o observa

Ela, criatura triste e sofrida, se esquece de toda a miséria subumana em que vive

E nesse momento volta a ser mulher... Consegue até sorrir para confortar sua cria.


O menino, enquanto suga em vão aquelas tetas caídas, provavelmente fechará os olhos

E em meio ao caos vai enxergar um brilho intenso

Vai imaginar pessoas boas o cercando e dando as mãos

O menino está no centro das atenções, já não é mais um fantasma

O menino enxuga as lágrimas que desenhavam um córrego em seu rosto pontudo

Parece que se esquece da fome que o corroia até pouco tempo atrás

Ou ela realmente sumiu...

Esquece também de que sentia dor

Esquece que a justiça é cega, mas a injustiça tem olhos de lince pra caçar os mais indefesos

Esquece de toda a imperfeição que o cerca e quase adormece

Então, cansado, fecha os olhos lentamente para nunca mais abri-los de novo.

Matheaus Siebra

01/12/2010

sábado, 28 de agosto de 2010

De qualquer maneira


Eu te amo
E não é um amor divino
Não tem nada de angelical
É um amor perverso, maldoso, beirando o diabólico
Um amor avesso a regras, a canções, discussões e dicionários
Eu te amo ardentemente... Eu te amo com gosto de suor
Eu te amo com unhas e dentes, com mordidas e tapas sem dó

Eu te amo nos seus lábios dançando flamenco
E também quando se cansam da solidão e convidam os meus prum forró
Eu te amo com sussurros no ouvido, com mãos inquietas, com suspiros de prazer
Eu te amo teu contorcionismo, teus grunhidos, tua loucura e tudo que é de você

Eu te amo com movimentos
Eu te amo teus gemidos
Eu te amo um grito
Eu te amo um silencio...
Eu te amo sem movimentos
Agora, cansado, te amo divinamente e a todo momento
Je t'aime, Aimêr

Matheaus Siebra
30/05/2010

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Um fiho




Um filho

Criatura com dentes, quem diria...

Que come feito leão, eu não sabia!

Que quase anda desengonçado e com alegria!


Um filho

Uma parte minha que não sou eu

Mas roubou muito de mim quando nasceu

Inclusive aquilo que desacreditava: o amor meu


Um filho

Que arranca minhas lágrimas escondidas

Quando não contém as suas na hora da partida

E soluçante me olha quase gritando adeus


Um filho

Que arranca meu sorriso escondido

Quando mostra o seu sorriso exibido

Jogando-se em mim e quase gritando: sou teu!


Um filho

Que na simplicidade do olhar diz tudo

Que parece espiar todo dia por cima do muro

Pra entender assim cada sentimento meu


Um filho

Um filho que me faltam palavras

Como se fosse eu a “tabula rasa”

E precisasse aprender a dizer amor...


Um filho raro,

Um filme raro

Que passa aos domingos no meu coração

Um coração tão grande, enorme

Mas que mesmo assim não pode

Conter toda minha emoção.

Matheaus Siebra

25/08/2010

sábado, 19 de junho de 2010

no baile das máscaras


Teu sorriso exibido
Eu me furei no espinho depois de arrancar a fulô
Teus lábios praticando sexo explícito com meu olhar
Eu me engaiolei em ti depois de me livrar do teu amor
E tua pele que agora já não posso...
...Tocar, cheirar, sentir, nem sequer negar
(quem me dera negar!)
Parece-me agora ainda mais bonita e macia
Mais ainda que qualquer poesia
Que nesta noite eu vou dizer e escutar

Danças frevo sobre a linha tênue
Que separa a insensatez do meu juízo
Com um companheiro que, com toda certeza, não sou eu
Quem é teu novo alguém que quer te fazer bailar
Quem é este que
Quando não restar da música nenhum ruído
Vai te empurrar pro lado de lá?

Matheaus Siebra

domingo, 25 de abril de 2010

Valle in crastinvm


As esperanças começam quando se termina o dia

Fracassado muitas vezes e algumas poucas com sucesso

Fecho os olhos e vejo-te chegando, trazendo-me boas noticias

Finalmente! É a hora da colheita...

Oh tempo! Quanta angustia trouxeste para pouca recompensa

Mísera Valia pra tamanho penar!

Com os olhos fechados impossível não pensar nisso

E lembrar que as expectativas humilham a surpresa

(e são cúmplices da decepção)

Talvez eu anseie por um desfecho

E descubra no fim que o desenrolar me interessava mais

(O final não merece seu meio)

E queira voltar pra um tempo atrás...

São as dúvidas que se acabam quando toma lugar em seu trono as esperanças de amanhã

Vejo-te chegar trazendo-me boas noticias

Mas sempre dizes:

- Valle in crastinvm!

Matheaus Siebra

14/08/2009

terça-feira, 6 de abril de 2010

Mão única

Fiz a barba

Pus um chapéu, um paletó e um sapato

O perfume mais caro eu escolhi e borrifei

lambuzei de gel meu cabelo e com um pente o ajeitei

e assim tão pronto, tão bonito, tão arrumado

fui passear pela contramão de minha rua

Matheaus Siebra
06/04/2010